Coordenadas equatoriais

Já havíamos mencionado que os pontos e círculos que são definidos sobre a superfície da Terra, têm seus equivalentes na esfera celeste. Esta situação é retratada na figura abaixo, na qual vemos uma representação da Terra (esfera interna) e da esfera celeste (esfera externa). Note que esta última tem raio infinito, o que é obviamente impossível de reproduzir na figura. Mas o importante da figura é o fato de permitir a visualização dos equivalentes celestes ao equador e pólos geográficos. Eles são naturalmente chamados de equador celeste e pólos celestes norte e sul.

O fato de haver um único plano equatorial, reconhecido como tal por todos os observadores em Terra, independente de onde estejam na sua superfície, constitui-se na condição básica para a definição de um sistema de coordenadas que seja universal, ou seja, utilizável por todos os observadores e cujas coordenadas para uma dada fonte tenham o mesmo valor irrespectivamente de quem as mede. Este é o sistema equatorial de coordenadas.

O sistema equatorial de coordenadas, assim como o horizontal, é também baseado em dois ângulos: a ascensão reta α e a declinação δ. Outra semelhança entre os dois sistemas é o fato de ambos serem definidos a partir de um plano de referência. No sistema horizontal este plano é o plano horizontal do observador. No sistema equatorial, como novamente implícito pelo próprio nome, o plano de referência é o plano que contém o equador da Terra e o equador celeste, ou plano equatorial . Na verdade, um observador atento vai notar que há uma enorme semelhança formal entre os sistemas horizontal e equatorial.

Na figura abaixo vemos uma representação gráfica do sistema equatorial, onde T é o observador e E é uma estrela. Também indicamos a posição do pólo norte celeste (PNC). O plano perpendicular a este último e que contém o observador é o plano equatorial. A intersecção entre o plano equatorial e a esfera celeste é o grande círculo chamado de equador celeste.

A declinação δ é definida como o ângulo entre o plano equatorial e a direção à estrela (segmento TE da figura). Analogamente ao caso horizontal, o sinal de δ caracteriza os pontos dos diferentes hemisférios separados pelo plano de referência: δ > 0° (δ < 0°) corresponde a pontos a norte (sul) do equador celeste. Já o conjunto de todos os pontos cuja declinação é constante é chamado de paralelo celeste ou paralelo de declinação . O complemento da declinação, representado pelo ângulo p na figura, se chama distância polar, sendo, como implica o próprio termo, o ângulo entre a direção à estrela e a direção ao pólo norte celeste (segmento de reta T-PNC). A distância polar desempenha, no sistema equatorial, o mesmo papel que a distância zenital no caso das coordenadas horizontais. Podemos então escrever:

δ + p = 90°

 

 

Já a ascensão reta, analogamente ao azimute no sistema horizontal, é contada ao longo do plano de referência. Logo a origem da contagem da ascensão reta α = 0° é necessariamente um círculo perpendicular ao equador celeste, que intercepta este último em um ponto. Este ponto é representado por γ na figura abaixo. O ponto γ (ou ponto vernal , ou ainda ponto de Áries) é um dos dois pontos da esfera celeste que pertence tanto ao equador celeste quanto à eclítica (ver capítulo sobre Movimento anual do Sol ). A ascensão reta é definida como o ângulo entre o plano que contém PNC, T e γ e o plano que contém PNC, T e a estrela E (ver figura). A intersecção deste último (primeiro) plano com a esfera celeste define um grande círculo chamado de círculo horário da estrela (do ponto vernal). Os pontos sobre o círculo horário da estrela têm o mesmo valor de α. Vemos pela figura que a ascensão reta é contada para leste e pode assumir valores entre 0° =< α =< 360°. É comum, no entanto, exprimirmos a ascensão reta em unidades de tempo. Se atribuirmos um domínio de 24h ao domínio de valores de α acima, teremos 1h = 15°. Por exemplo, os pontos sobre o círculo horário do ponto γ têm α = 0° = 0h; os pontos sobre o círculo horário 30° a leste do ponto vernal terão α = 30°=2h. Esta relação entre ascensão reta e tempo ficará mais nítida adiante, quando discutirmos o conceito de ângulo horário e as diferentes definições de sistemas de tempo.

 

Ângulo horário

Ângulo horário H de um astro é o ângulo entre o círculo horário deste astro e o meridiano astronômico do observador. Este ângulo, assim como a ascensão reta, também é contado sobre o equador celeste, variando de 0° =< H =< 360°. A figura abaixo é muito semelhante à mostrada acima. A diferença é a inclusão do meridiano astronômico do observador na figura. Conforme explicado anteriormente, o meridiano é o grande círculo no céu que contém o zênite e os pontos cardeais norte e sul. O meridiano necessariamente contém também os pólos celestes norte e sul. Na figura vemos que o ângulo horário cresce, a partir do meridiano, em direção oposta à ascensão reta. H cresce para oeste, acompanhando o movimento diurno dos astros (de leste para oeste). Já α cresce para leste, seguindo o movimento anual do Sol.

 

É precisamente o fato de acompanhar o movimento diurno dos astros que torna H um indicador útil para contagem de tempo. Por exemplo, se num dado instante uma estrela está no meridiano astronômico de um observador, seu ângulo horário é H = 0°. Um dia depois, após a Terra dar um giro completo em torno de seu eixo, a estrela estará novamente passando pelo meridiano do observador. Durante estas duas passagens meridianas, o ângulo horário da estrela terá variado de 0° a 360°. Podemos, portanto, definir a hora do dia com base no ângulo horário do astro. Daí o nome! Como o ângulo horário varre o domínio de 0° a 360° em um dia, podemos dizer que qualquer estrela percorre 15°=(360°/24h) de ângulo horário por hora. Essa é na verdade a velocidade angular de rotação de nosso planeta.

A verdade é que o céu é um imenso relógio, do qual os astros são os ponteiros. A partir da posição destes ponteiros podemos então obter uma medida da hora. Por exemplo, define-se hora sideral (S) como sendo simplesmente o ângulo horário do ponto vernal (ponto γ). Pela figura acima, vemos então que:

S = Hγ = H* + α*

onde H* e α* se referem a uma estrela qualquer.

Podemos também usar o ângulo horário do Sol como indicador da hora. Uma vantagem óbvia de fazê-lo reside no fato de que o Sol é facilmente localizável no céu, o mesmo não se aplicando ao ponto vernal. A hora solar (M) é então dada pela expressão:

M = Hsol + 12h

onde Hsol é o ângulo horário do Sol em um dado instante. O acréscimo de 12h serve simplesmente para fazer com que a passagem meridiana do Sol (Hsol = 0h) corresponda ao meio-dia (M = 12h) e não à meia-noite. Mais adiante voltaremos a discutir, em mais detalhe, os sistemas de marcação de tempo usados em Astronomia.


Para fins de fixação, veja se consegue responder as perguntas abaixo.

1) Qual o valor de declinação do Pólo Sul Celeste? E qual o valor de δ para o Pólo Norte Celeste?

2) Qual o valor de α de um ponto cujo círculo horário faz um ângulo de 180° com o círculo horário do ponto vernal?

3) Qual o valor de δ de uma estrela situada 45° a Sul equador celeste?

4) Seja um observador situado no pólo norte geográfico da Terra. Que ponto de referência do sistema equatorial se situa no zênite deste observador? Qual a declinação de um ponto cuja distância zenital medida por este observador é 30°?

5) Qual o valor de distância polar de uma estrela de declinação δ = 20°? E de uma estrela com δ = -50°?


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Basilio Santiago, santiago@if.ufrgs.br